23 de abr. de 2013

A Reforma Protestante: uma revolução dos leigos


"O papel do leigo de animar e aperfeiçoar a ordem das realidades temporais com o espírito do evangelho"
Por *Edson Sampel
Imagine como seria a cristandade atual se não houvesse ocorrido a assim chamada Reforma... Difícil de figurar tal hipótese, não é? Principalmente em tempos neoliberais, em que a religião é muita vez encarada como um capital simbólico ou um artigo de consumo. Impossível acreditar que o cristianismo ainda estivesse circunscrito à Igreja católica.
Vamos tentar pôr os pingos nos is. O termo “reforma” é completamente inadequado, pois, no século XVI, frei Lutero desencadeou uma autêntica “revolução” no cristianismo. Não entraremos no mérito das teses luteranas. Entretanto, percebe-se claramente a inidoneidade histórico-gramatical do vocábulo “reforma” para designar as mudanças estruturais propostas por frei Lutero e seus sequazes. O que é uma “reforma”? Ora, quando dizemos que faremos uma “reforma” na nossa casa, qualquer interlocutor compreenderá que não haverá transformações radicais no imóvel; dar-se-á uma demão de tinta nas paredes, trocar-se-ão os azulejos etc. Ora, a “Reforma” protestante implicou  uma “transformação radical” do cristianismo, o que caracteriza uma “revolução”. Um único exemplo é suficiente para demonstrar o caráter revolucionário do protestantismo:  dos sete sacramentos, a Reforma só admitiu um, o batismo.
Deflagrou a Reforma (revolução) um presbítero (padre): frei Martinho Lutero. Tudo começou com a afixação das famosas 95 teses na porta da Catedral de Witembergo, na Alemanha, no dia 31 de outubro de 1517. Nada obstante, os príncipes tedescos, leigos, assumiram imediatamente a indigitada revolução religiosa. Os motivos pelos quais assim procederam, se para confiscar as terras e bens da Igreja, não nos interessam neste momento. Importa constatar que a Reforma ou revolução só prosperou, porque os leigos, mormente os governantes, compraram a ideia de frei Lutero. Processo parecido se deu nos outros países onde a Reforma vingou; os leigos se tornaram pastores e, destarte, passaram a pregar o “cristianismo reformado”. Este fenômeno se estendeu até o presente. As denominações evangélicas hodiernas não dispõem propriamente de uma hierarquia eclesiástica, até porque a Reforma extinguiu o sacramento da ordem. Desta feita, não há diferença ontológica (sacramental) entre o evangélico simples fiel e o evangélico pastor.  Todo são tecnicamente leigos.
Nos nossos dias, a Igreja católica aguarda outra revolução por parte dos leigos! Espera que eles cumpram seu papel de animar e aperfeiçoar a ordem das realidades temporais com o espírito do evangelho, consoante reza o cânon 225, § 2. Esta é a missão batismal cometida aos leigos católicos. Os misteres intraeclesiais, como catequese e ministérios extraordinários, são deveras relevantes. Todavia, o que define a atuação eclesial do leigo é o estar no mundo, ou seja, a secularidade extraeclesial. Nas  instâncias da família, da profissão, da economia, da política etc., o leigo católico é chamado a evangelizar, na condição de autêntico membro da Igreja.
Para poder realizar tarefa tão nobre e cristã, o leigo não pode prescindir dos sacramentos, ministrados pelos componentes da hierarquia (padres e bispos). O sacramento da eucaristia é requisito sine qua non para o sucesso da empreitada dos leigos. O aludido sacramento constitui o centro da vida dos leigos e de todos os outros integrantes da Igreja.
Se os leigos católicos se compenetrarem da missão eclesial e batismal que lhes toca, decerto a sociedade política será mais justa e fraterna. Consoante explicou algures Dom Dadeus Grings, arcebispo de Porto Alegre, quando se questiona sobre o que a Igreja realiza no campo de bem comum, deve-se devolver a pergunta aos leigos.
*Edson Luiz Sampel é Doutor em Direito Canônico pela  Pontifícia Universidade Lateranese, do Vaticano.
Professor da Escola Dominicana de Teologia (EDT).


Fonte: Boletim ZENIT [ZP130421]

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